É fácil imaginar…

É fácil imaginar aquelas cenas do World Trade Center como uma coisa distante. Afinal de contas estão ocorrendo lá do outro lado do mundo. Existe um dogma em jornalismo: a proximidade da notícia. Para a maioria absoluta (veja bem, eu disse maioria e não unanimidade) do público que lê, escuta ou assiste, é muito mais forte, tem mais repercussão e é mais interessante saber o que acontece na casa ao lado, do que tomar conhecimento do acontece em outro país. E não importa se a briga do casal vizinho não vai afetar sua vida além da próxima conversa com sua esposa, e os acontecimentos em New York vão afetar o resto de sua vida.
Não tive em minhas mãos um relatório concreto, mas ao que tudo indica, o sequestro de Silvio Santos “produziu” mais audiência no Brasil do que as cenas dos aviões destruindo as Torres Gêmeas. Na terça-feira passada, dia 11 de setembro, enquanto eu e a Nancy estávamos assistindo aterrorizados o que acontecia, nossa diarista andada de um lado para o outro, tirava pó daqui e dali, ligava o aspirador, alheia a tudo. Em um determinado momento, fiz ela sentar no sofá e “reduzi” os eventos de forma compreensível para ela. Pessoa extremamente humilde, não tinha a menor idéia do que estava acontecendo. O mais próximo que ela estava dos eventos era saber que existia um outro país chamado Estados Unidos. Detalhes? Nada. Não sabia o que era New York, quem dirá Manhattan ou WTC. Fiz então ela assistir às cenas das colisões, explicando tudo. O que eram aqueles edifícios, qual sua altura, quantas pessoas estavam morrendo naquele momento, o que representava para o mundo aquele evento, sua possível origem e sua provável consequência. Deixei claro que aqueles pontinhos que às vezes caíam das janelas eram pessoas. E então ela caiu em si. Subitamente ela estava próxima dos eventos. O choque em sua face a acompanhou o resto do dia.
Já falei aqui e repito: não sou americanista, desaprovo e ataco sempre que posso os posicionamentos americanos no oriente médio, acho que eles são arrogantes, militaristas e brigões. Desaprovo as atitudes da mídia que estão querendo jogar a opinião pública contra os árabes. Mas o que os 31 brasileiros que morreram lá têm com isto? E os outros milhares? E aqueles cujos corpos simplesmente desapareceram no incêndio? E, o que mais me perturba, aquela pessoa solitária, sem família, quase sem amigos, cuja morte vai simplesmente passar despercebida?
É por isto que fico indignado com manifestações de “bem feito”, “eles mereciam”, “veio em boa hora”, “os americanos são arrogantes”, “isto vai abaixar a crista deles”, e especialmente “plantaram vento e colheram tempestade”. Muitas pessoas têm este mesmo ponto de vista, no melhor estilo “que se dane, não afeta minha vida”. É CLARO QUE AFETA. Vai afetar copletamente a vida de todos nós. No preço dos combustíveis, nas aplicações financeiras, na rotina. Um imbecil ousou dizer: “enquanto um amigo meu não morrer eu estou cagando e andando”. Falta percepção para este tipo de gente entender que aquelas manchinhas que se contorciam em chamas até o chão, tinham nome. Tinham família, amigos. Tinham uma história pessoal, um passado e um futuro. Você já parou para pensar no seu próximo final de semana? Nas suas próximas férias? O que você vai comprar de presente para sua namorada(o) no Natal? Pois aqueles seres humanos que morreram no dia 11 de setembro, também. Quando tomar sua próxima cerveja, pense nisto.

This entry was posted in Uncategorized. Bookmark the permalink.