Anjo Pornográfico Fico sempre em

Anjo Pornográfico
Fico sempre em dúvida sobre qual deve ser exatamente o papel do biógrafo em relação ao biografado. Acabei de ler O Anjo Pornográfico, a biografia de Nelson Rodrigues, escrita pelo jornalista Ruy Castro.
Este trabalho sobre a vida e a obra do “maldito” Nelson Rodrigues é impressionante. Como é impressionante a forma leve e arejada com que Castro nos conduz pelas mais de 450 páginas do livro. Eu não percebia o tempo passando enquanto lia os detalhes da vida de Rodrigues.
O livro, desde o título, é brilhante. As fotos, a introdução das personagens ao longo dos anos, os problemas, os conflitos, os amores, as mortes e a composição dos capítulos, acabaram serializando a vida de Rodrigues, o que transforma esta obra em uma vitrine do tipo de literatura que o próprio Rodrigues produzia: um folhetim.
Fiquei incomodado só com uma coisa e é aqui que coloco a minha dúvida sobre a relação biógrafo/biografado. Entendo que sejamos atraídos a escrever sobre a vida de alguém que apreciamos. Mas Castro trai sua admiração por Rodrigues inúmeras vezes, comprometendo o distanciamento que o biógrafo, a meu ver, deve ter. Perde-se em objetividade quanto mais nos identificamos com o “objeto” do estudo. Atitudes reprováveis de Nelson Rodrigues passam pelo livro sublinhadas por comentários irônicos de Castro, o que acaba amenizando a gravidade dos fatos. Fica parecendo que se está tentando desculpar, quase justificar este tipo de atitude, em virtude da grandeza de sua obra.
O que me leva a fazer outro comentário: Nelson Rodrigues era um gênio, mas devagar com o andor. Não vamos idolatrar o homem nem sua obra. Só porque um texto foi escrito por ele não é uma obra prima. Ele também escreveu textos ruins que não merecem uma segunda leitura. Vamos colocar os pés no chão e, de preferência, dar uma aparadinha nas asas deste anjo.

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1 Response to Anjo Pornográfico Fico sempre em

  1. Rodrigo Martins says:

    Vá lá Fábio… Mas convenhamos, qual de nós nunca se sentiu um pouquinho Nelson Rodrigues? A diferença é que no fundo não gostamos de admitir que pecamos continuamente nos nossos pensamentos. O que Nelson nos trouxe foi a expressão do interior; dos pecados que nos atormentam — fato que poucos tiveram coragem de fazer (e ele o fez com maestria). Ora, quanto aos textos medíocres: não temos nós pensamentos simplórios? Apesar de tudo, concordo em grande parte contigo. Excelente visão. Parabéns.

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